India - Digital Public Infrastructure
Shankar Maruwada interviewing Nandan Nilekani about DPI

India - Digital Public Infrastructure

Acabo de chegar da Índia. E como sempre, a experiência foi surreal. Principalmente se você pensa em Impacto e como resolver grandes problemas sociais.

Em 2016 recebi a visita de indianos sócios de um fundo de impacto na Índia, o Aspada (hoje LightRock) e especialmente Sahil Kini, com quem venho falando durante todos esses anos. Naquele momento, fiquei impressionada com as soluções tecnologicas da India e como aquilo poderia ajudar a resolver grandes questões sociais no Brasil também. Muitos problemas são similares, mas a escala dos problemas na Índia é 10 vezes maior.

Fomos almoçar e, durante o almoço, um dos indianos entrou no celular e fez uma transferência de uma conta para outra no seu WhatsApp usando biometria através de um sistema chamado UPI, sem custos! No Brasil, até novembro de 2020, ainda não existia o Pix. Pagávamos até R$10 por cada TED ou DOC! Imaginem uma nação com 220 milhões de habitantes, dos quais 190 milhões bancarizados, pagando essa taxa para cada transferência? É o que tínhamos antes do #PIX. Fora os custos de transação das “maquinhinhas” onde um pequeno empreendedor que vendi

a um bem por R$20,00 acabava deixando quase R$5,00 na transação.

Perguntei ao indiano do que se tratava aquele sistema. E ele me respondeu: “You don’t know India Stack? You don´t know about Aadhaar?” Como era possível quase ninguém no Brasil saber que a Índia havia digitalizado 1,3 bilhões de pessoas, que até então não tinham nem documentos e que, com o Aadhaar, criado em 2009, passaram a ter acesso a bancos, contas para transferências, crédito etc.

A partir daí passei a conversar com o as pessoas na Índia que haviam trabalhado no Aadhaar. O Sahil Kini foi um dos primeiros funcionários do time de Nandan Nilekani, fundador da Infosys . Nandan havia deixado a empresa em 2009 para criar uma autarquia junto ao governo e ajudar na criação de algo que transformaria a Índia.

Diferente de muitos líderes pelo mundo, Nandan entendia a perspectiva do povo e sabia que ao empoderar 1,3 bilhões de pessoas (hoje 1,4bi) ele estaria transformando um passivo em ativo para o país. “Empower the People”.

Para criar isso tudo, o primeiro passo foi criar uma identidade confiável. Com essa identidade, as pessoas, até então “invisíveis”, passaram a poder abrir uma conta no banco, obter crédito e participar de programas sociais. O Digital ID na Índia consiste num código de 12 dígitos ligado a sua face, impressão digital e íris. Ou seja, não tem como você não ser encontrado. Não tem como abrir uma conta apenas um desses dados. A conta fica ligada à sua íris – é única. Além disso, a Índia criou uma API pública que permite que provedores de serviços verifiquem se o usuário é quem ele diz que é. Ou seja, o provedor de serviço não tem de pagar uma empresa pela checagem do KYC. No modelo da India, o Estado e o Modelo de Negócios trabalham para a sociedade, não o contrário.  Talvez pudéssemos refletir se essa não seria uma solução para reduzir o número de assaltos de celulares devido ao Pix – já que aqui, a conta pode estar ligada ao seu número de telefone e você pode ir trocando este telefone, mas a Íris você não troca.

Em todas as entrevistas que Nandan dá, ele sempre fala de “Data Empowerment”. A Internet não é de graça, você paga deixando lá seus dados. Hoje nossos dados ficam na Amazon, Google, Microsoft, bancos, Facebook, etc... A Índia adotou uma abordagem diferente: criou plataformas abertas (“Open Source Digital Platforms”) do zero e customizadas para o contexto indiano, e ao invés de deixar as plataformas nas mãos de poucos “Tech Giants”, construiu esses sistemas como bens públicos.

DPI – “Digital Public Infrastructure”

O Aadhaar exemplifica a noção de que a infraestrutura digital deve ser um bem público. A identidade digital é a base de confiança para todos os serviços que as pessoas usam na Internet. Diferente do que acontece hoje onde Google e Facebook são os maiores provedores de identidade digital. Se essas plataformas sabem não apenas quem você é, mas sua localização, suas preferencias, seus comportamentos – elas são donas dos seus dados e comercializam a favor delas, não a seu favor. A India criou inúmeras infraestruturas digitais públicas, conhecidas como “India Stack” – isso permite ao governo e ao setor privado servir, em tempo real, 1,4 bilhões de pessoas a um custo muito baixo. “Empower the people!” Exemplos de DPI são o e-KYC, o UPI (“Unified Payment Interface”) e outros.

Na Índia os princípios que guiam o uso da Internet são: a infraestrutura digital deve ser um bem público e as pessoas devem ser empoderadas com seus próprios dados. Com tantos dados sendo gerados pelo uso de “smartphones”, “smart cities” e outros dispositivos – a Índia vai ser um país rico em dados antes de ser rico economicamente.

Quando a pessoa se torna dona de seus dados, ela pode usá-los a seu favor. Imagine um pequeno negócio que é dono do histórico de dados de seu fluxo de caixa: ele pode negociar crédito a seu favor, ele é dono dos dados. Isso é o que o Nandan chama de “Data to The People”.

Para reflexão: uma pesquisa realizada pelo DataFavela em 2023 mostra que se todas as favelas fossem organizadas em um estado, o seu PIB seria de R$200 bilhões, ou seja, o terceiro estado mais rico do Brasil. No entanto, quando olhamos o IDEB (educação) e IDH (desenvolvimento) esses números não são altos. Fiquei me perguntando para onde ia essa diferença. Você nota que quase todo mundo na favela tem celular. Quando você entende que tipo de conteúdo as pessoas estão consumindo, você entende seu padrão de consumo, seus desejos, seus sonhos. E aí você entende que como o dado não fica com as pessoas, elas se tornam apenas consumidoras daquilo que as plataformas vendem. E talvez muito do PIB das favelas esteja saindo por ai... Imaginem se as pessoas fossem donas de seus dados, se pudessem negociar crédito com qualquer instituição, se pudessem receber ofertas de serviços porque são “data rich” (ricas em dados). Just thinking...

Passei a última semana na Infosys, no evento do Societal Thinking com pessoas de 15 países diferentes. Obrigada @Sanjaypuhorit pelo convite!

Artigos para quem tiver interesse:

https://www.foreignaffairs.com/articles/asia/2018-08-13/data-people

https://www.businesstoday.in/technology/news/story/dont-waste-time-on-models-nandan-nilekani-explains-why-data-is-more-important-in-ai-for-india-409230-2023-12-13

https://www.theinformation.com/articles/the-billionaire-doing-the-unthinkable

India - Digital Public Infrastructure

I just arrived from India. And as always, the experience was surreal. Especially if you think about Impact and how to solve big social problems.

In 2016 I received a visit from an Impact fund called Aspada (@LightRock today) from India. I was impressed by the technology solutions and how it could help solve major social issues in Brazil as well. Many problems are similar, but the scale of problems in India is 10 times bigger.

We went out for lunch and, during lunch, one of the Indians got on his cell phone and made a transfer from one account to another on his WhatsApp using biometrics through a system called UPI, free of charge! In Brazil, until November 2020, Pix did not exist. We paid up to R$10 for each transaction (TED or DOC)! Imagine a nation with 220 million people, of which 190 million have bank accounts, paying this fee for each transfer? That's what we had before PIX. We also have the transaction costs of the “little machines” where a small entrepreneur who sells something for R$20.00 ends up leaving almost R$5.00 in the transaction. Think about it.

I asked the Indian what that system was about. And he replied: “You don’t know India Stack? You don't know about Aadhaar?” How was it possible that almost no one in Brazil knew that India had digitized 1.3 billion people, who until then did not even have documents and who, with Aadhaar, created in 2009, began to have access to banks, accounts for transfers, credit etc.

From there I started talking to people in India who had worked on Aadhaar. I met Sahil Kini , one of the first employees on the team that Nandan Nilekani, founder of Infosys, started in the government. Nandan left Infosys in 2009 to create an agency with the government and help create something that would transform India.

Unlike many leaders around the world, Nandan understood the people's perspective and knew that by empowering 1.3 billion people (today 1.4 billion) he would be transforming a liability into an asset for the country. “Empower the People”.

To create all of this, the first step was to create a trusted identity. With this identity, people, until then “invisible”, were able to open a bank account, obtain credit and participate in social programs. Digital ID in India consists of a 12-digit code linked to your face, fingerprint, and iris. In other words, there's no way you won't be found. There is no way to open an account with just one of these details. Your account is linked to your iris, – it is unique. Additionally, India has created a public API that allows service providers to verify that a user is who they say they are. In other words, the service provider does not have to pay a company for the KYC check. In India's model, the State and the Business Models work for the society, not the other way around. Perhaps we could reflect on whether this would be a solution to reduce the number of cell phone robberies in Brazil due to Pix – since here, the account may be linked to your phone number and you can change this phone number, but you can't change your iris.

In every interview Nandan gives, he always talks about “Data Empowerment”. The Internet is not free, you pay by leaving your data there. Today our data stays with Amazon, Google, Microsoft, banks, Facebook, etc... India adopted a different approach: it created open platforms (“Open Source Digital Platforms”) from scratch and customized for the Indian context, and instead of leaving platforms in the hands of a few “Tech Giants”, built these systems as public goods.

DPI – “Digital Public Infrastructure”

Aadhaar exemplifies the notion that digital infrastructure should be a public good. Digital identity is the foundation of trust for all the services people use on the Internet. This is different from what happens today where Google and Facebook are the largest providers of digital identity. If these platforms know not just who you are, but your location, your preferences, your behaviors – they own your data and commercialize it in their favor, not in your favor. India has created numerous public digital infrastructures, known as the “India Stack” – this allows the government and the private sector to serve, in real time, 1.4 billion people at a very low cost. “Empower the people!” Examples of DPI are e-KYC, UPI (“Unified Payment Interface”) and others.

In India, the principles that guide the use of the Internet are: digital infrastructure should be a public good and people should be empowered with their own data. With so much data being generated through the use of “smartphones”, “smart cities” and other devices – India will be a data-rich country before it is economically rich.

When a person becomes the owner of their data, they can use it to their advantage. Imagine a small business that owns the historical data of its cash flow: it can negotiate credit in its favor, it owns the data. This is what Nandan calls “Data to The People”.

A reflection after all the above: a survey carried out by DataFavela in 2023 shows that if all favelas were organized in one state, its GDP would be R$200 billion, that is, the third richest state in Brazil. However, when we look at education indexes and HDI (development indexes) these numbers are low. I was wondering where this difference goes. When you go to the favelas, you notice that almost everyone has a cell phone. When you understand what type of content people are consuming, you understand their consumption pattern, their desires, their dreams. And then you understand people don’t own their data, they become consumers of what the platforms want to sell. And perhaps a lot of the favelas' GDP is leaving this way... Imagine if people owned their data, if they could negotiate credit with any institution, if they could receive different service offers because they are “data rich”. Just thinking...

Articles:

https://www.foreignaffairs.com/articles/asia/2018-08-13/data-people

https://www.businesstoday.in/technology/news/story/dont-waste-time-on-models-nandan-nilekani-explains-why-data-is-more-important-in-ai-for-india-409230-2023-12-13

https://www.theinformation.com/articles/the-billionaire-doing-the-unthinkable

#dataempowerment #impactinvesting #esg Digital gov.br #indiastack #aadhaar DATAPREV #BC+ Reginaldo Lima ITS #wrightcapital

Societal Thinking @sanjaypuhorit CV Madhukar @pramodvarma

Nandan Nilekani
Shankar Maruwada (EkStep Foundation), eu, Pramod Varma (Aadhaar), CV Madhukar (Co-Develop) and Manu Gupta (Seeds)

Vera Nice de Almeida Silva

Empreendedorismo e Inovação Digital

6 m

Que fantástico ver que foi possível fazer o que eles fizeram na Índia! E sobre o Brasil? Que soluções poderemos desenvolver para criar novos caminhos de impacto e transformação social, tecnológica, financeira, para os brasileiros? Considerando que das 21 milhões de empresas do Brasil, 14 Milhões (ou seja 66%) são Empreendedores Individuais... (que estão reinventando a relação com a produção econômica.) Creio que a Educação e a informação podem fazer com que haja a UNIDADE na voz e no PROPÓSITO em torno da mudança social do Brasil. Sou grata que existam pessoas influentes como você, Fernanda (e o fundo da qual faz parte) que pensam formas de apoiar no Brasil projetos que tenham igual impacto social, tais quais estes que foram implementados na Índia. Gratidão, Fernanda.

Fernando Teles

Investidor, Advisor, Board Member

6 m

É isso Fernanda Camargo. Data ownership

Bartira Almeida

Cofundadora e Presidente do Instituto Ponte; Presidente do Conselho de Administração Morar Construtora e Incorporadora

6 m

Obrigada por compartilhar! E seu texto mostra a sua paixão pelo aprendizado e pela india!

Leide Takahashi

Senior Manager in Nature Conservation | Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza

6 m

Parabens Fernanda! Artigo excelente que nos provoca muito!!!👏

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