Artigo
Filipe Campos

Filipe
Campos


Especialista em Investimento Imobiliário pela London School of Economics.
Analista financeiro independente registado na CMVM.
Mestre em Economia pela Universidade Nova.

Pandemia e arrendamento: uma janela de oportunidade?

Há 3 anos - 17 de dezembro de 2020
Filipe Campos

Filipe
Campos


Especialista em Investimento Imobiliário pela London School of Economics.
Analista financeiro independente registado na CMVM.
Mestre em Economia pela Universidade Nova.

A crise que vivemos motivada pela pandemia de covid-19, ou do novo coronavírus, pode ser uma oportunidade para o mercado de arrendamento?

Em tempos de crise é justo perguntar-se a si próprio se compensa investir num imóvel para arrendar. Além da crise, ao tentar responder a esta pergunta, vale a pena prestar atenção aos sinais que há vários anos o mercado do arrendamento tem vindo a dar.

Arrendamento cresce mas pouco

Quando olhamos para os dados do INE (Instituto Nacional de Estatística) relativamente aos novos contratos de arrendamento familiares nos últimos 12 meses, é percetível que o mercado de arrendamento continua sem sinais de crescimento relevante. Ainda assim, entre o 2º semestre de 2019 e o 1º de 2020, este indicador aumentou 1,8% (74.088 contratos). Não sabemos no entanto, quantos contratos terminaram.

Mas sabemos que o arrendamento representa 26% do mercado habitacional. Deste total, 13% trata-se de arrendamento de renda reduzida ou com apoios sociais. Também sabemos que, da outra metade que é arrendada a preços de mercado, cerca de metade (6,5%) estará ocupado por pessoas sem descendentes o que indicia potencial para tipologias mais baixas. A Área Metropolitana de Lisboa concentra 33% dos novos contratos, a área metropolitana do Porto 17%, o Algarve e Alentejo 6%, a Região de Coimbra 5% e a Região de Aveiro 4%.

Relativamente ao valor das rendas, os números do INE dizem-nos que o valor aumentou 2,8% em Portugal entre o 2º semestre de 2019 e o 1º semestre de 2020. Na Área Metropolitana de Lisboa, neste período, o valor das rendas aumentou 4,3%, na Área Metropolitana do Porto 4,0%, no Algarve 4,6%, no Alentejo 3,9% (Alentejo Litoral 10%), na região de Coimbra 0,5% e na região de Aveiro também 0,5%. 

Das 317 freguesias (de um total de 564) para as quais o INE tem informação, neste período apenas 87 viram os preços descer. Neste caso as maiores quedas foram nas freguesias do Milharado (-23,8%), Castro Marim (-16,9%) e Campo Maior (-16,5%). Das restantes 230 freguesias os preços praticados aumentaram. Em Baião, Arcozelo e São Brás de Alportel esta variação foi superior a 20%.

O que nos diz o mercado?

Como já sabemos, os números do INE estão sempre um pouco desfasados do tempo. A Proteste Investe, através dos dados recolhidos na plataforma Casafari, já analisou a evolução dos dados durante o período da pandemia. 

Em termos agregados, entre maio e novembro, os valores médios anunciados por concelho caíram: -6,9% em Albufeira, -0,6% em Almada, -6,1% na Amadora, -9,6% em Braga, -4,6% em Cascais, -13,9% em Faro, -1,2% em Guimarães, -8,4% em Lisboa, -12,9% em Loulé, -3,2% em Loures, -5,1% na Maia, -9,8% em Matosinhos, -6,2% em Oeiras, -7,1% em Olhão, -2,6% em Portimão, -3,0% no Porto, -10% na Póvoa do Varzim, -2,8% no Seixal, -1,1% em Setúbal, -12% em Sintra, -4,5% em Tavira, -1,9% em Vila Nova de Gaia e -2,1% em Vila Real de Santo António. 

Em sentido contrário, os preços do arrendamento aumentaram nos concelhos de Aveiro +9,8%, Coimbra +5%, Lagos 12%, Odivelas 9%, Valongo +13,3%. Ou seja, o caminho parece ser o inverso ao que se verificou no primeiro semestre do ano. Maior número de quedas no valor dos arrendamentos e não de aumento.

Lições do passado

Juntamente com os dados apresentados, de queda de preços do arrendamento, e um cenário de baixas taxas de juro que incentiva à aquisição, é talvez um pouco impossível acreditar que o arrendamento será um bom mercado para investir neste momento

No entanto, se reparar no gráfico da variação de preços do arrendamento contra a variação de preços de venda pode verificar que o preço do ativo em si varia muito mais do que a remuneração que pode retirar dele. Em 25 anos, apenas se verificaram 4 períodos de queda dos preços do arrendamento entre trimestres. Por isso, apesar da redução já observada nas rendas, caso os preços de venda dos imóveis desçam de forma a mais que compensar aquela redução, podemos então atingir um bom momento para investir nos imóveis para arrendar.

precos arrendamento

Fonte: OCDE

Tendo em conta esta certeza, os momentos chave do investimento estão então no momento da compra para que mais rapidamente chegue ao break-even do seu investimento e no valor que define para a sua renda. Para o ajudar temos disponível um simulador que lhe permite calcular a rentabilidade do seu investimento.

As principais dificuldades

Uma das primeiras dificuldades para o proprietário continuará a ser o ajuste da renda praticada às variações de rendimento disponível que, como podemos observar no gráfico, tem sofrido ao longo dos anos uma maior volatilidade comparativamente com as rendas.

arrendamento

Fonte: OCDE e INE

Por outro lado, se é esperado que do mercado hipotecário resultem alguns incumprimentos de créditos e consequente recolocação dos imóveis no mercado, nada impede que esse cenário de incumprimentos também não aconteça no mercado de arrendamento. Numa perspetiva de longo prazo, será essencial que os proprietários estejam preparados para cenários de eventuais quedas nas taxas de ocupação e de rendas cobradas.

Adicionalmente, e relacionado com a dimensão da oferta, o mercado de arrendamento deverá voltar a sofrer a pressão da evolução do turismo daqui a 2 anos. Ou seja, alguns imóveis que hoje estão a abandonar o regime do Alojamento Local poderão voltar. 

Outra das dificuldades que se prevê, relacionada com as anteriores, e patente por um estudo realizado pelo Instituto BBVA de Pensões é a situação económica das gerações que aí vêm e das que atualmente têm maior poder de compra. 

O estudo aborda uma geração que agora estará na casa dos 40/50 anos e dele se concluem alguns dados importantes para o mercado de arrendamento.

O rendimento médio do agregado familiar desta geração é de 1500 euros, que está ligeiramente acima dos dados do INE que abrange toda a população, e 16% vive em casa arrendada, o que é ligeiramente superior aos números médios para Portugal. Destes 16%, 46% vive em imóveis com rendas abaixo de 1000 euros e 20% com rendas entre 1000 e 1500 euros. 

Estas informações, sobre a segmentação da renda e das dificuldades de poupança dos agregados, são úteis para enquadrar o imóvel que tem e a dimensão da procura que vai atingir. Por exemplo, com estes dados e assumindo que uma renda não deve representar mais do que 40% do rendimento do agregado familiar, o valor de renda que pode efetivamente praticar, para acertar na maioria da amostra, ficaria entre 400 (1000 x 40%) e 600 (1500 x 40%) euros.

Tendo em conta estes valores e os dados de novembro das freguesias atualmente analisadas no nosso comparador de preços, para a tipologia T1, das 107 para as quais temos valores, conseguiria ter maior probabilidade de arrendamento em 42, ou seja abaixo de 600 euros. Para a tipologia T2, das 121 freguesias analisadas conseguiria praticar preços abaixo de 600 euros apenas em 17 freguesias. Para a tipologia T3 este número reduz-se para somente 4 freguesias em 102.

Outra dificuldade que teremos para os pequenos investidores será o aumento de concorrência, quer de outros pequenos investidores que comprovadamente veem o imobiliário como ativo para investir e obter algum rendimento, de investidores profissionais, do próprio Estado, de fundos de investimento e promotores imobiliários. Num crescente cenário de aumento de encargos com a habitação (impostos, serviços, condomínios, manutenção) que se traduzem em yields anuais abaixo de 3%, esta rentabilidade terá de compensar o esforço para ser o melhor proprietário face à concorrência e a quebra de margens.

Perspetivas para o futuro

Várias razões, como a mobilidade, a evolução demográfica, o mercado de trabalho, o turismo, a disponibilização de informação e a digitalização, têm ajudado a desenhar o caminho que está a ser esboçado há vários anos e que teve durante estes 3 últimos trimestres de pandemia um momento de pausa que, no entanto e não pelas melhores razões, poderá vir a dar força ao mercado de arrendamento. 

No entanto, é necessário esperar alguns meses para medir o verdadeiro impacto na economia, e assim saber o grau de força deste mercado. Isto porque, apesar das baixas taxas de juro, num cenário de economia frágil poderá haver algumas reticências e dificuldades à compra de casa, favorecendo o mercado de arrendamento. Por outro lado, a perspetiva de queda de preços pode levar a quem tiver disponibilidade para investir e assim aproveitar as oportunidades que surgirem no mercado, ir aumentando o seu portefólio imobiliário.

Apesar dessa incerteza, um dos defeitos que limita o grau de força do mercado nacional é a clara falta de oferta de casas no mercado, e em concreto no de arrendamento, que pressiona os preços em alta, o que se torna uma vantagem para o proprietário. Em simultâneo, este mercado tem de “combater” com o mercado das casas que vão sendo compradas para habitação própria.

Apesar dos recentes incentivos, sobretudo, fiscais no arrendamento para contratos de maior duração o aumento do número de novos contratos não é ainda significativo. No entanto, esta lacuna de mercado combinada com o rendimento quase certo que um bom arrendamento pode trazer num largo período de tempo é só por si um incentivo. Relativamente a este ponto será preciso aguardar até meados do próximo ano para medir o verdadeiro sentido da evolução da oferta ainda que, aparentemente, esteja a aumentar. 

Num futuro que não se espera fácil em termos sociais e económicos, as iniciativas públicas e privadas far-se-ão sentir nos próximos anos para tentar aumentar o parque habitacional de arrendamento. Ou eventualmente até um trabalho complementar entre as duas partes, como já existe com programas como o do arrendamento acessível e ou programa da renda segura

Neste domínio, a principal dificuldade caberá aos proprietários privados, que terão por um lado de controlar os seus custos operacionais assumindo ao mesmo tempo alguma estabilidade fiscal sobre os rendimentos auferidos e sobre os impostos (diretos e indiretos) que têm de pagar sobre os imóveis que são seus, apesar de estarem arrendados, e por outro têm de estabelecer um casamento de longo prazo com os seus inquilinos. Uma renda mais baixa pode ser sinónimo de uma rentabilidade mais baixa para o investidor mas no final de contas tudo depende do regime contratual que adotar para o arrendamento e do valor do imóvel.

A resposta adicional do Estado, que não será imediata pelas características próprias do desenvolvimento do setor e da sua estrutura, na contribuição para o mercado de arrendamento virá do parque habitacional público aproveitando sobretudo imóveis devolutos, colocando-se no papel de proprietário e como verdadeiro player de mercado. O seu papel, deverá contudo ser no domínio do arrendamento acessível respondendo às necessidades das classes médias e classes baixas. 

Do ponto de vista do proprietário, seja investidor profissional ou amador, a perspetiva para o futuro tem de ser a do compromisso com o longo prazo (arrendamentos de longa duração) e a de perceber qual a melhor solução de arrendamento para a zona em que está o seu imóvel tendo conta as suas características. Para uns pode ser alugar quartos para estudantes, para outros pode ser alugar para trabalhadores de uma mesma empresa, para outros alugar a famílias e para outros alugar a turistas.

Nesse sentido, é importante medir a rentabilidade que retira do seu investimento. A PROTESTE INVESTE disponibiliza o simulador "Arrendar é rentável?" onde pode inserir alguns dados do imóvel (valor, município) do arrendamento (valor da renda, duração do contrato, taxa de ocupação) e de variáveis ao nível de custos que influenciam o seu resultado final. 

 
 

O conteúdo deste artigo pode ser reproduzido para fins não-comerciais com o consentimento expresso da DECO PROTESTE, com indicação da fonte e ligação para esta página. Ver Termos e Condições.

Partilhe este artigo